sábado, 4 de junho de 2011

O fim de uma era


Chega a ser curioso como que mínimos detalhes me fazem lembrar que um período muito gostoso da minha vida acabou.

Ontem fui almoçar sozinha no Shopping Iguatemi. Me servi num restaurante qualquer por quilo e sentei numa mesinha do lado de onde tinha escolhido comer. Peguei uma sobremesa; uma gelatina - uma vez que eu estou num esforço danado pra continuar emagrecendo. Eu já tinha terminado de almoçar quando uma senhorinha muito arrumada perguntou se podia dividir a mesa comigo. A praça de alimentação estava lotada, afinal era 6ª Feira e eu estava sozinha, não tinha porque dizer não. Ela se sentou e começou a comer.
Foi quando eu abri minha gelatina. E reparei que ela era colorida. Era de morango em cima, aqueles cremes no meio e de limão embaixo. NA HORA eu me lembrei da minha avó. Olhei para a senhorinha, olhei para a gelatina e me deu um nó na garganta muito grande. Comi a gelatina segurando o choro e de repente foi como se um filme estivesse passando bem na minha frente.

Me lembrei das gelatinas coloridas que a minha vó sempre fazia quando eu era criança. Toda vez que ia visitá-la na praia, a gelatina estava lá me esperando. Eu ficava tão feliz, minha vó sabia disso. Tanto que a primeira coisa que ela dizia quando eu chegava em sua casa, era:
- filhinha, fiz gelatina colorida pra você.

Eu pulava no pescoço dela, tamanha era minha felicidade. E mesmo depois que eu cresci e me tornei uma adolescente insuportável que odiava reuniões familiares, ela continuava fazendo a tal gelatina, talvez na tentativa de me deixar animada por estar na praia ao invés de estar com os meus outros amigos adolescentes insuportáveis.
Me lembrei que eu nunca mais vou ter a gelatina colorida preparada pelas mãos dela. E foi só eu ter lembrado disso, que eu na hora comecei a contabilizar mais uma série de coisas, comidas, eventos que eu nunca mais vou ter.

As ligações nos meus aniversários. Eram sempre eles (meus avós) que ligavam primeiro. Se meu aniversário caísse num sábado eles me ligavam as 7:00 da manhã. Eu ficava meio puta porque queria dormir até tarde, mas meu avô sempre me acordava. Aliás, esse ano eu senti falta disso. Minha avó me ligou logo cedo, mas meu avô não pois fazia exatamente duas semanas que ele tinha falecido. Já consegui sentir o baque, a saudade... faltou alguma coisa.

Os natais. Eu sempre reclamava também. Reclamava das orações intermináveis do meu avô, reclamava das toalhas que minha vó me dava todos os anos, reclamava da falta de presentes depois que cresci, daqueles cultos caseiros que eles faziam depois da ceia cantando as mesmas músicas. Eu vou sentir falta de tudo isso. Vou sentir falta de ver meu avô tocando violino ao lado da minha mãe, que tocava teclado enquanto minha vó, minhas tias e a tia das minhas tias cantavam "Noite de paz". Vou sentir falta das toalhas, dos chinelos e dos panos de prato que a minha vó bordava. Inclusive, vou sentir falta do meu avô andando pela casa fechando todas as janelas - mesmo fazendo o maior calor do mundo lá fora - alegando que não queria mosquitos na casa.
Aliás, isso me lembra dele andando com o mata-mosquitos rosa que ele carregava pra cima e pra baixo, matando qualquer um que aparecesse na sua frente, rs.

A casa onde eles passaram os últimos anos da vida deles, na praia que já foi posta a venda. A casa onde eu passei tantos feriados, férias, finais de semana, dia das mães, natal, ano novo, aniversários... onde minha vó tinha o jardim dela que ela cuidava com tanto esmero. Cada vez que eu ia lá tinha uma flor nova brotando e ela vinha toda orgulhosa me mostrar. Onde meu avô mantinha uma oficina nos fundos do quintal e onde ele passava a maior parte do seu dia lá dentro fazendo sinos de vento, consertando nosso secador de cabelo e o que mais a gente pedisse.

As bicicletas dos dois ainda estão lá. A bicicleta roxa da Caloi que a minha avó usava pra ir no supermercado, ou passear comigo quando eu ainda andava de rodinhas nas laterais da minha bicicleta. Mas que aos poucos ela foi deixando de lado, parou de andar e passou a bicicleta pra mim. Aliás, foi meu avô que arrancou as rodinhas e me ensinou a andar que nem gente grande. Eu chorei, esperneei e gritei com ele. E ele com a paciência que só Deus mesmo, me ensinando até eu aprender. Todos os dias de manhãzinha, ele acordava, pegava a sua bicicleta e ia andar na praia de ponta a ponta. Depois parava, tomava uma água de côco, passava na padaria, levava pão fresquinho pra casa e tomava banho na ducha. Era a vida que ele amava.

E eu amava passar férias lá porque além de ter vários amigos, meus avós faziam de tudo pra me deixar feliz. Minha vó adorava emprestar uma cestinha de vime que ela tinha, só pra eu poder ir na pracinha perto de casa com os amigos e fazer pic nic.
As festas juninas que a gente fazia na rua... quem colava todas as bandeirinhas com a maior paciência do mundo? Era ela, claro.
Se fosse onze da noite e eu comentasse que tinha vontade de bolinhos de chuva, minha vó ia pra cozinha e fazia vários. Rosquinhas de nata, pãozinho de polvilho azedo, pipoca, suco de uva, bolo de macarrão, salada, suco de maracujá fresquinho... todas essas coisas que eu amava e me farão muita falta.

O cheiro deles, o abraço, a voz dos dois e até as lições de moral ultrapassadas que eles me davam. Quando eu penso que nunca mais terei nada disso, me dá um aperto no coração, as lágrimas aparecem de imediato, parece que me falta o ar.
Sim, são lembranças boas... mas justamente por serem boas que me deixam assim, feliz porém triste ao mesmo tempo. Porque eu daria tudo pra reviver cada momento desses.

Mas é o fim de uma época, talvez a melhor época da minha vida.
A época de que meus avós eram vivos e eles foram as melhores pessoas que eu já conheci.

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